DANO SOCIAL “EX OFFICIO” E AS IMPLICAÇÕES PROCESSUAIS

Por Tiago Torres,

Foto ilustrativa

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Já resta pacífico que, no âmbito da Responsabilidade Civil, se admite muito além das meras indenizações por dano moral e material, fruto de reiteradas decisões dos Tribunais Superiores que ampliam o conceito de dano indenizável. Dentre estes, encontra-se o Dano Social, fruto das concepções de Dignidade da Pessoa Humana e de Dano Moral à Coletividade.

Os Danos Sociais, segundo Antônio Junqueira de Azevedo, “são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida da população”. Esta concepção encontra respaldo nas disposições do Código Civil de 2002, cuja metodologia segue um ponto de vista de valorização da sociedade, em decorrência da própria onda de “Constitucionalização” do Direito Privado.

No entanto, tem sido observada na prática forense a aplicação de indenizações por Dano Social “ex officio” pelos magistrados, ou seja, sem requerimento anterior de alguma das partes. Embora o nítido caráter de reparação de lesão à toda sociedade e coerção à futuras lesões, o que se afigura totalmente louvável, devem ser observados alguns aspectos de suma importância, sobretudo de caráter processual.

A aplicação de uma condenação sem prévio requerimento denota clara violação ao artigo 472 do Código de Processo Civil, o qual indica que “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”, ou seja, claro vício extra petita, ou “fora do pedido”. Forçoso registrar que, por tal vício, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu alguns processos cuja condenação por Dano Social ocorreu sem requerimento na petição inicial*.

Neste mesmo prisma, resta o questionamento de quem será o destinatário/receptor da multa de 10% do valor da condenação, disposta no artigo 475-J do Código de Processo Civil, caso o condenado pela prática de Dano Social não pague o fixado em Sentença. Existente neste caso verdadeiro espaço vazio, na medida em que, por um lado, a entidade beneficiada não poderia ingressar na fase de cumprimento de sentença para requerer a condenação na multa citada, e, por outro, estaria a empresa condenada, em tese, livre da multa pelo não pagamento de tal parcela da condenação por inexistência do titular de tal valor na lide.

Ainda interessante ressaltar que se discute a aplicação do Dano Social em ações individuais, porquanto em prol de toda coletividade, o que atrairia a atuação do Ministério Público, através do ajuizamento de uma Ação Civil Pública, na defesa dos direitos lesados. Neste sentido, o Enunciado 455 da 5ª Jornada de Direito Civil do CJF/STJ firmou o entendimento de que “A expressão ‘dano’ no art. 944 abrange não só os danos individuais, materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para propor ações coletivas”.

Em síntese, a aplicação de indenizações por Dano Social atende aos preceitos constitucionais e também do Código de Defesa do Consumidor, porquanto normas de ordem pública e de interesse social. Doutra banda, atenta contra as disposições do Código de Processo Civil citadas, que igualmente são de ordem pública, e contra a existência de ação e legitimado ativo específico para reclamação e defesa dos direitos do consumidor. Certamente, discussão que suscita várias controvérsias e carecerá de apreciação mais densa do STJ, visando pacificar a matéria.

*Fonte:http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=448&tmp.texto=111024

BIBLIOGRAFIA:

AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: O Código Civil e sua interdisciplinaridade, cit., p. 376.

Tiago Torres 120 X 150TIAGO HENRIQUE TORRES. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho – RJ. Graduado pela Faculdade de Direito de Pedro Leopoldo/MG. Membro Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil – RS. Advogado.

Contato: Email: juridico.tht@gmail.com – Telefone (31) 9150-9440

O PROCESSO COMO GARANTIDOR DAS DECISÕES DEMOCRÁTICAS

Por Tiago Torres,

Iniciemos com uma conclusão: o Processo é um meio através do qual os objetivos principais de um Estado Democrático podem ser conquistados. Contudo, nos leva também a uma grande crítica: o Processo atualmente não se mostra ferramenta a serviço da Democracia.

A temática processual vigente nos demonstra que o Processo é conduzido não pelas partes, mas sim pelo Estado-juiz, de forma a que os fatos, fundamentação, provas, e todo o conteúdo envolvido em determinada lide, devem ser submetidos pelas partes a este Estado-juiz, que, utilizando-se do seu convencimento, convicções e poder de decisão, ou mesmo através do seu olhar nobre sobre a demanda, concederá às partes o melhor veredicto em sua ótica.

Estas características não nos demonstram um Estado de Direito Democrático, mas sim um Estado de Bem Estar Social, onde se vislumbra controle estatal exacerbado. Pode-se dizer até mesmo, que, em muitas situações, estar-se-ia diante de um Estado Absolutista, porquanto “forma de governo em que o detentor do poder exerce este último sem dependência ou controle de outros poderes”, nas palavras do jurista Lênio Streck.

A legitimação das decisões atuais decorre do fato simples de ser emanada por “órgão” detido das prerrogativas, competência e poder para proferir as decisões. Porém, ao considerarmos um padrão estatal no qual os rumos da atuação do Estado são balizados pelo olhar e agir concreto do povo, devidamente regidos pelas Leis, sobretudo a Constituição da República, a legitimação deve decorrer diretamente desta participação dos cidadãos.

As modernas concepções de processo nos ofertam conceituação pautada, sobretudo, nas garantias e princípios inseridos no corpo da Constituição da República, como bem nos mostra o insigne processualista mineiro, Rosemiro Pereira Leal, ao dizer que “a instituição constitucionalizada PROCESSO que se define pelos princípios do contraditório, isonomia e ampla defesa é o meio mais concreto de se obter Democracia também em sede judicial”.

Considerando estarmos em um modelo de Estado em que a Democracia é princípio, o Processo tem papel de suma importância, por pressupor participação de todos. A efetivação desta concepção é cada vez mais estudada pela doutrina, objetivando criar um elo cada vez mais tênue entre a Ciência Processual e o próprio Direito Constitucional. É muito mais que um simples meio de solução de controvérsias perante o Poder Judiciário.

Em síntese, como a busca pela efetivação dos preceitos constitucionais é a tônica do atual momento da ciência jurídica, porquanto reconhecida efetivamente a força da Constituição não apenas como mera diretriz, mas também vislumbrando sua auto-executoriedade, enxergar o Processo como ferramenta da Democracia é algo de suma importância para o próprio fortalecimento do Estado.

BIBLIOGRAFIA:

LEAL, Rosemiro Pereira Leal. Processo e Hermenêutica Constitucional a partir do Estado de Direito Democrático. In: Relativização Institucional da Coisa Julgada – Temática Processual e Reflexões Jurídicas. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

STRECK, Lênio Luiz. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 3.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

Tiago Torres 120 X 150TIAGO HENRIQUE TORRES, advogado atuante no Direito Cível, Trabalhista e Bancário. Graduado pela Faculdade de Direito de Pedro Leopoldo. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho – RJ. Membro Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil.

Contatos: Email: juridico.tht@gmail.com – Telefone (031) 9192-8857